Mesmo não querendo desenvolver uma teologia de férias ou de descanso, nos propomos a olhar à Palavra de Deus com este tema em mente. Fazendo isto nos deparamos com alguns fatos que deveriam nos conduzir a uma reflexão pessoal de como encaramos as férias e como as mesmas são vividas para a glória do criador.
Nas primeiras páginas da Bíblia vemos um fato que não pode passar despercebido para quem pensa neste assunto. Vemos ali como Deus nos apresenta, pelo exemplo, o que deveria ser nossa atitude para com o trabalho e o descanso. “No sétimo dia Deus já havia concluído a obra que realizara, e nesse dia descansou. Abençoou Deus o sétimo dia e o santificou, porque nele descansou de toda a obra que realizara na criação.” (Gn 2:2.3). Deus não nos dá um exemplo de alguém que busca sombra e água fresca, Deus trabalhara muito fazendo com que a criação toda chegasse à existência. Mesmo que não precisasse tanto como nós de descanso após um esforço intenso, Deus nos mostra que o descanso tem o seu lugar. E mais ainda, Deus abençoa este dia e o santifica. Mesmo sendo muito dedicado e esforçado, mesmo que não seja preguiçoso, Deus também não está viciado em trabalho e proporciona a si mesmo um momento de descanso.
O primeiro ensinamento a respeito de descanso e férias é dado pelo exemplo de Deus, logo após a criação. Mas logo em seguida, nas próximas páginas da Bíblia, encontramos uma palavra de Deus a respeito, em forma de ordenação. “Lembra-te do dia de sábado, para santificá-lo. Trabalharás seis dias e neles farás todos os teus trabalhos, mas o sétimo dia é o sábado dedicado ao SENHOR, o teu Deus. Nesse dia não farás trabalho algum, nem tu, nem teus filhos ou filhas, nem teus servos ou servas, nem teus animais, nem os estrangeiros que morarem em tuas cidades” (Ex 20:8-10).
Certamente Deus não faz nada sem propósito. Se ele ordena que descansemos no sétimo dia então, além de usarmos este dia para a glória do criador, Deus está consciente do fato de precisarmos regularmente do descanso. O Novo Testamento nos diz que o nosso corpo é o templo de Espírito Santo. Diante disto é difícil de se imaginar que Deus queira para si um templo que está cansado e exausto. Isto não seria um lugar agradável para morar.
Virando várias páginas da Bíblia chegamos ao Novo Testamento. Ali deparamos com um fato bem interessante com relação ao descanso e por que não dizer, às férias. “Os apóstolos reuniram-se a Jesus e lhe relataram tudo o que tinham feito e ensinado. Havia muita gente indo e vindo, a ponto de eles não terem tempo para comer. Jesus lhes disse: “Venham comigo para um lugar deserto e descansem um pouco” (Mc 6:30.31). Os apóstolos acabam de retornar de um esforço missionário evangelístico. Além disso recebem a notícia de que João Batista fora decapitado. O movimento em torno de Jesus está tão intenso que nem mesmo há condições para alimentação adequada. Neste momento Jesus entra em ação com esta proposta brilhante: Procuremos um lugar deserto, isto é, um lugar em que não haja tantas pessoas, um lugar que proporciona tempo e oportunidade de estarem a sós com o seu mestre. Apesar do sucesso do seu ministério Jesus está consciente que precisa prevenir o “stress” que poderia ser o resultado de atividades tão intensas.
Ainda outro assunto é discutido na Bíblia e bem destacado. Já líamos em Êxodo 20 que todos da unidade doméstica estariam incluídos no descanso regular semanal. Interessante notar ali também, que inclusive os animais não deveria fazer tarefa alguma no dia do descanso. Isto fez com que me dei conta que Deus prevê o descanso para a natureza. Veja, por exemplo, o que lemos em Levítico 25,2-5 “Diga o seguinte aos israelitas: Quando vocês entrarem na terra que lhes dou, a própria terra guardará um sábado para o SENHOR. Durante seis anos semeiem as suas lavouras, aparem as suas vinhas e façam a colheita de suas plantações. Mas no sétimo ano a terra terá um sábado de descanso, um sábado dedicado ao SENHOR. Não semeiem as suas lavouras, nem aparem as suas vinhas”. Assim como os homens e os animais precisam de descanso, a natureza também precisa da mesma e Deus já o estabeleceu assim junto ao seu povo.
Há mais um momento na vida de Jesus que merece a nossa atenção neste contexto. Mesmo que anteriormente Jesus estimulara o descanso, levara os discípulos a uma viagem de recreação, Jesus aponta agora que também pode ocorrer descanso em hora errada. Ele diz aos seus seguidores ali no Getsémani o seguinte: “Vocês ainda dormem e descansam? Basta! Chegou a hora! Eis que o Filho do homem está sendo entregue nas mãos dos pecadores” (Mc 14:41). Há momentos que não comportam descanso e ócio, é preciso adotar uma atitude bem diferente. Na realidade não se pode indicar os momentos não apropriados para o descanso, mas certamente teremos a devida orientação por parte de Deus a respeito desta questão.
Ciente de não ter esgotado este pano de fundo para férias e descanso, nos propomos agora a fazer algumas indagações e reflexões. Deus quer que nós tenhamos tempo para restaurar as forças físicas, mentais e espirituais. Nossa inquietação, no entanto, é o que nós chamamos de descanso, o que nós praticamos como descanso e que nós, por isso, encaramos como as bem merecidas férias. Estaria Deus contente como o descanso que praticamos? Ele convidou os discípulos para uma viagem de férias para estarem com ele e terem tempo para estar em sintonia com o Filho de Deus. Será que planejamos as nossas férias para alcançar este propósito?
Podemos nos pergunto também, “será que Deus aprovaria os locais que escolhemos para descansar?” Os lugares mais badalados e também procurados são as praias e os balneários das termas. Será que estes lugares nos proporcionam descanso e restauração física, mental e espiritual? Uma vez, ali há um aglomerado tão grande de pessoas, sempre há alguma coisa acontecendo e nos convidando para envolvimento. Por outro lado, corre solta a sensualidade em todas as formas, ela parece ser o fator principal nestes “locais de férias”. Se formos honestos e atenciosos não descobriremos que, em vez de descanso, alcançamos algo bem mais forte em emoções e adrenalina e, por que não dizer, em estímulos sexuais? Como se isto não bastasse ainda, muitos ali ficarão com a auto estima tão abalada ao verem que o próprio corpo não está dentro dos padrões de beleza estabelecidos por aqueles que procuram e desenvolvem os padrões de beleza em nossos dias. Toda a mídia se esforça a desenvolver um modelo de descanso que prevê e precisa que as férias sejam regadas a muita bebida alcoólica.
É mais do que evidente que em nossos dias realmente precisamos de férias, precisamos de descanso e precisamos recarregar as nossas baterias. O nosso esgotamento ocorre nas três áreas que já indicamos anteriormente: física, mental e espiritual. Muitas vezes somos exigidos de forma tão vigorosa fisicamente que o corpo fica arrasado. Isto tem conseqüências sobre a mente e certamente também sobre a parte espiritual.
Outras vezes, e isto depende da nossa atividade, a mente é exigida tanto que afeta o corpo também e em conseqüência o nosso espírito. Já outras atividades exigem tanto do “coração e do espírito”, deixando-nos arrasados nesta área. Mas está exausto, este cansaço também afeta o corpo e a mente. Mesmo que teoricamente funcionamos em áreas, nós formamos um todo e o todo sofre com dificuldades em uma ou outra área. Dentro deste raciocínio deve-se ter uma inquietação: nossas férias facilmente se tornam o momento ou o período em que nós também damos férias a Deus. As coisas parecem estar tão perfeitas e gostosas que não precisamos de Deus. Ou então dormimos tanto pela manhã para já não haver mais tempo para um período devocional antes de irmos os passeios. Por outro lado estes passeios nos cansam tanto que à tarde temos que ter aquela soneca gostosa. À noite, muitas vezes, acontece alguma festa junto com amigos ou parentes que estão no mesmo lugar e a hora fica avançada demais para ainda termos tempo para Deus. Dentro desta linha uma pergunta: Será que Deus aprovaria o fato de darmos, em nossas férias, férias também a Deus?
Padre Anderson
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