Recentemente os Executivos estadual e municipal publicaram no Diário Oficial suas respectivas folhas de pagamento funcionais. Trata-se de um raro gesto de transparência! Na folha vimos o que já esperávamos: um brutal desnível salarial entre os que ganham menos e os que ganham mais. De onde vem tal desnível? A resposta não é difícil: de anos e anos de leis imorais com vantagens absurdas, muitas vezes em cascata, criadas para beneficiar este ou aquele, amigo deste ou parente daquele outro. Isto fruto da simbiose espúria entre os três poderes!
Do empreguismo despudorado, que inchou a máquina funcional, impedindo o pagamento de salários dignos: quem entra pela janela, não tem direito de reclamar salário digno, quem entra por pistolão deve contentar-se com pouco! Se se entope o Estado de funcionários, não há dinheiro para pagar dignamente a todos!do mal crônico no nosso Estado chamado nepotismo: quantos e quantos parentes de políticos e grandolas foram empregados e, neste caso, em geral, com dois agravantes: com salários altos e sem trabalhar – isto mesmo: sem bater um prego numa broa!
Agora, consertar tudo isso não é fácil nem rápido! Mas, já é extremamente salutar que o Governador e a Prefeita tenham tido a coragem de publicar sem reservas as contas funcionais do Executivo. Mas, daqui nasce uma séria questão: e os Legislativos estadual e municipal (Assembléia Legislativa e Câmara de Vereadores)? E o Poder Judiciário (o Tribunal de Contas)? Quando farão o mesmo? Diante da atitude do Executivo, torna-se moralmente obrigatório para os dois outros poderes públicos exibirem suas folhas de pagamento funcional. Caso se neguem, a conclusão da sociedade será uma só, inevitável: as folhas funcionais dos dois outros poderes envolvem casos espúrios de corrupção e ilegalidade! O Legislativo e o Judiciário não devem e não podem, não têm o direito, como poderes públicos, de deixar dúvidas sobre sua lisura! Desconfia-se – toda a sociedade alagoana – que há graves irregularidades e disparidades nas folhas funcionais da Assembléia Legislativa, do Tribunal de Justiça e da Câmara de Vereadores de Maceió. Pois bem, só há um modo de provar o contrário: a transparência! A sociedade já cansou de escutar figurões da vida pública, de rosto grave, voz impostada e ternos bem talhados, fazendo juras de amor ao povo e de respeito pela coisa pública... quando todos sabem que a realidade é bem distante desta hipócrita aparência!
Apesar da descrença de muitos, nosso País tem melhorado: está passando por um profundo processo de tomada de consciência cívica, maior cobrança no trato da coisa pública, de maior fiscalização de seus dirigentes e de uma maior transparência na máquina estatal. Este processo não é obra do governo somente: é ação de muitos e por muito tempo! A imprensa, a escola, as igrejas, as organizações não governamentais, as associações civis... todos estes sujeitos da vida social têm dado, de um modo ou de outro, sua contribuição para o amadurecimento de nosso povo! Deve-se reconhecer que o próprio Governo Federal e o Congresso Nacional têm dado passos significativos neste sentido. Muitos governos estaduais caminham – uns mais, outros menos – na mesma direção. Pois bem: como aceitar, então, que a folha funcional dos poderes acima elencados seja escondida do povo - esse mesmo povo que paga os impostos e do qual estes poderes estão a serviço? Que moral terão os Legislativos estadual e municipal e o Judiciário, caso se neguem a expor sua situação funcional? Que moral para reivindicar duodécimos e repasses do Executivo? O povo não é bobo! Já se foi o tempo!
A esta altura, o leitor poderia perguntar: e o que tem a Igreja a ver com isso? E o que tem um jornal religioso a dizer sobre isso? Que a Igreja cuide dos santos, rezas e procissões... e os políticos da política! Nada disso! A Igreja, sem entrar na política partidária, tem o dever sagrado – dever de todo e qualquer cristão! – de defender os valores do Evangelho, valores tão humanos: a verdade, a honestidade, a justiça, a paz!
Aqui não se trata de acusar ninguém, mas somente de pedir seriedade aos nossos governantes, exatamente tendo em vista o bem comum e a construção de uma sociedade mais conforme aos valores do Evangelho. Como é triste quando vemos no nosso Estado realizarem-se aquelas palavras de Jesus: “Sabeis que aqueles que vemos governar as nações as dominam, e os seus grandes as tiranizam” (Mc 10,42). Estejamos atentos à norma de Jesus: “Entre vós não será assim!” (Mc 10,43).
Então, que abram a caixa preta; que tornem públicas as folhas de pagamento!
Monsenhor Henrique Soares da Costa
Bispo eleito auxiliar de Aracaju.
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