O Dr. Wlademir Paes de Lira, “juiz de direito, titular da 5ª vara de família de Maceió, cristão, heterossexual, casado e pai de três filhos”, escreveu um artigo na Gazeta de Alagoas do 14 de agosto passado sobre a “União Homossexual”. No seu texto, o magistrado externou sua indignação contra a Igreja católica pelo recente documento contra o reconhecimento legal da união civil de pessoas do mesmo sexo. É um direito que lhe assiste, como cidadão, como cristão e como juiz de direito. No entanto, alguns aspectos do escrito do Dr. Juiz merecem observações.
1. O Dr. Wlademir é injusto com a Igreja quando afirma que ela está “na contramão da história, como lhe é peculiar”, e chega mesmo a caluniar e a demonstrar pouca intimidade com a história quando afirma que “na Idade Média, a igreja católica perseguiu, torturou e matou pessoas que eram julgadas suspeitas de difundir idéias desvirtuadas dos ensinamentos católicos, em sua maioria mulheres (Inquisição); foi conivente com a escravidão; omissa em relação ao holocausto”. As palavras revelam que o juiz tem uma visão preconceituosa e distorcida da Igreja e sobre a Igreja. Uma boa leitura certamente haveria de fazê-lo mais moderado e matizado nas suas afirmações. Velhos jargões e preconceitos repetidos à exaustão nem por isso se tornam verdades...
2. Peca também o Dr. Wlademir por analisar toda a questão da posição da Igreja em relação à união civil entre homossexuais simplesmente do ponto de vista da lei e do direito. Talvez pense ele que a Igreja é sucursal da OAB, caudatária do Supremo Tribunal Federal ou tenha como norma última a Constituição Federal. Esquece-se que a perspectiva da Igreja é outra: primeiramente a do Evangelho e da Tradição apostólica e também a da busca de uma ética não somente para cristãos católicos, mas para toda a humanidade. Não há que recriminar o Magistrado por ser contrário à posição da Igreja; há, no entanto que contestá-lo e censurá-lo por desconhecer que a Igreja tem o dever e o direito de pronunciar-se sobre o assunto do ponto de vista religioso e desejar que tal ponto de vista seja ouvido e levado em consideração. Os cânones dos manda-chuvas do Instituto Brasileiro do Direito de Família (IBDFAM), que ele cita com tanta euforia, não servem, ipso facto, para a Igreja. A pretensão de alguns juristas de igualar sem mais o matrimônio a uma outra união afetiva, qualquer que seja sua natureza, é inaceitável do ponto de vista do Novo Testamento e da Igreja católica. Para os cristãos (até os não-católicos), a família não somente é uma realidade antropológica e sociológica, mas também teológica. E isto tem que ser dito! Se para as pessoas enquanto cidadãs a “Lei Maior” – como escreve o Dr. Wlademir – é a Constituição, para nós, como cristãos, a Lei Maior é o Evangelho. Diante dele, a Constituição é lei menor!
3. Outro problema do texto do ilustre Juiz da Vara de Família – e este, um pecado mortal para um cristão! – é querer que a Igreja pregue somente para os seus fiéis. Parece que na mentalidade do nosso autor, religião é coisa privada e não deve ter nenhuma incidência, nenhuma importância na construção da sociedade e na tessitura de uma ética social. Ele é defensor do cristianismo de sacristia! É uma visão intimista e privatista da religião. Nada mais anticristão, nada mais estranho ao Evangelho! O ser sal da terra e luz do mundo vai para o espaço! Para os cristãos, no entanto, Jesus Cristo é o Senhor e critério último da Verdade do homem. Tem razão o Doutor Juiz em defender a liberdade de consciência, a liberdade de opinião e de ação. Mas não tem nenhuma razão quando quer tolher à Igreja o direito de opinar, de procurar convencer e de emanar orientações práticas para os seus fiéis e os homens e mulheres hétero e homossexuais de boa vontade. A Igreja não pode perseguir, nem tirar o direito de ninguém ao que quer que seja, mas pode dizer o que pensa e orientar e motivar comportamentos; pode e deve dizer o que é certo ou errado, moral ou imoral à luz do Evangelho. Para isso, goste ou não o indignado Magistrado, recebeu a autoridade de Cristo! Seja qual for o cristianismo que o articulista professa, deveria pensar nisso. Um cristianismo que não seja sal e luz, não serve para nada!
Teria sido ótimo que, no seu arrazoado, o caro Dr. Wlademir tivesse adotado um tom mais propositivo e respeitoso. Mesmo porque a Igreja, que ele acusou injustamente de ir “na contramão da história” como um vício a ela “peculiar”, estava ao lado de muitos e muitos de seus colegas do mundo do direito nos tristes anos da ditadura militar... Ninguém é obrigado a concordar com a Igreja, muito menos neste assunto tão complexo e polêmico como a homossexualidade. O tema é por demais intricado, envolvendo aspectos muito diversos. Certamente aqui a Igreja deve ouvir e aprender também. Continuemos, tentemos, com respeito, moderação e amor à verdade.
Uma última observação. Foi infeliz por parte do Doutor Juiz sua declaração pública de heterossexualidade. Ninguém iria julgá-lo homossexual só porque defendeu a causa dos homossexuais. Além do mais, ser homossexual não é nenhum demérito para ninguém e não faz ninguém menos digno ou menos humanos. Ao menos é isso que a Igreja ensina...
Monsenhor Henrique Soares da Costa
Bispo eleito auxiliar de Aracaju.
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