Muitas vezes, neste espaço editorial, este Jornal tem chamado atenção para a perda dos valores na nossa sociedade. Cremos que esta perda caminha em proporção direta com a perda do sentido de Deus, último e inapelável referencial moral da humanidade.
No nosso País, este déficit moral manifesta-se na pobreza crônica e institucionalizada, na violência, no consumo de entorpecentes, na destruição da família, no hedonismo, no desregramento e aberrações sexuais com ares de normalidade e humanismo, etc.
Há, no entanto, uma manifestação, um sintoma dessa perda que indigna de modo mais forte e gritante: trata-se da corrupção dos nossos dirigentes e da classe política como um todo. A sensação que temos é que nossos governantes perderam de vez o pudor. Criou-se uma convicção – infelizmente correta – de que os membros do Legislativo e do Executivo estão acima da lei. Lei foi feita para o povo e esses senhores não são povo: estão acima dele como o céu está acima da terra. Sempre há exceções, poucas é verdade, mas a percepção geral é a de que os políticos ingressam na vida pública para proveito e benefício próprios. Não há consciência cívica, não há preocupação real e profunda em relação ao povo, sobretudo em relação aos pobres. Assim, assistimos a um crescente que parece inesgotável na prática da corrupção, agora como nunca de modo despudorado. Prova disso é como nossas casas legislativas com toda desenvoltura e pouco caso para com o povo absolve, encobre e justifica os corruptos. E isto por uma razão simples: a grande maioria é cúmplice de delitos semelhantes.
A única instância que poderia exigir de modo definitivo que nossos políticos servissem ao povo e não se servissem dele seria o próprio povo. Mas este, anêmico de critérios morais, absolve mensaleiros, esquece velhas corrupções e reelege culpados de corrupção ativa, passiva e inativa. Cria-se um círculos vicioso perigosíssimo: um povo que padece de pobreza de critérios morais gera políticos imorais, que tranquilamente corrompem e se deixam corromper porque sabem que serão reeleitos por cidadãos que já não cobram de seus líderes um alto padrão moral. O fato é que, pouco a pouco, acompanhamos entre desiludidos e indignados a degradação moral de nossas lideranças. E, infelizmente, tal indignação e desilusão não se traduzem em derrota eleitoral para os corruptos, porque quando chega o momento do voto o pobre se vende por uma dentadura e o rico por um emprego sem trabalhar ou outro cambalacho de ocasião...
A questão é que essa corrupção edêmica vai provocando três misérias:
1. A espoliação do bem comum, já que projetos na área de saúde, educação, saneamento básico, transporte e outros tantos, essenciais para uma boa infra-estrutura do nosso País, vão sendo transcurados. A corrupção política tem como salário a fome e a miséria dos pobres.
2. O desencanto com as instituições democráticas que, cedo ou tarde, abrirá as portas para ditaduras como a de Hugo Chavez na Venezuela. Muitos brasileiros já não acreditam na democracia. É triste!
3. o desestímulo a que surjam lideranças políticas realmente sadias e comprometidas com o bem comum, já que as pessoas de bem evitam ingressar numa política que se tornou antro de bandidagem.
Qual o remédio para isso? A capacidade de indignar-se, de denunciar, de cobrar; a mobilização da opinião pública, a insistência em dizer que tudo isso pode ser diferente... E, sobretudo, a convicção de que o voto pode ser expressão e instrumento do desejo de mudança e da efetivação da mesma. No caso daquele que é cristão tudo isto fica ainda mais patente quando nos confrontamos com o Evangelho, que é verdade, justiça, retidão, amor solidário e paz. Um cristão não pode se portar na política como se o Evangelho não existisse e aquele que ilumina sua vida com o Evangelho não pode fazer de conta que a política não precisa da luz de Cristo. Em outras palavras: nossa fidelidade a Cristo nos impede que nos conformemos com o mal e nos impulsiona a procurar meios de uma sociedade melhor e de dirigentes mais dignos. Religião não é ópio, é força transformadora e libertadora.
Monsenhor Henrique Soares da Costa
Bispo eleito auxiliar de Aracaju.
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